Chamar obesidade de doença é algo positivo?
Boa Vida

Chamar obesidade de doença é algo positivo?


Em junho de 2013, a Associação Médica Americana declarou oficialmente a obesidade como doença. Muitos profissionais de saúde foram a favor dessa decisão e dessa nomenclatura, acreditando que assim o estigma seria reduzido, já que o obeso seria visto como um doente, uma pessoa que tem um “problema" de saúde, e não um indivíduo com “pouco controle” ou “pouca força de vontade”. Além disso, esses profissionais enxergaram que dessa forma as pessoas se tornariam mais conscientes dos riscos de algumas complicações tipicamente associadas ao excesso de peso.

Entretanto, uma outra corrente de profissionais não foi favorável a esta decisão. Eles alegam que considerar a obesidade como uma doença poderia fazer com que os indivíduos se tornassem mais “acomodados” e fatalistas, eximindo-os (e eximindo também a sociedade) da responsabilidade por terem se tornado obesos. Nessa linha, um estudo recente publicado por duas psicólogas americanas encontrou que obesos que leram um material dizendo que a obesidade era uma doença relataram menor preocupação com o peso e escolheram uma opção mais calórica quando foi pedido para que escolhessem um sanduíche de um cardápio. Eles foram comparados com outro grupo de obesos, que leu um material dizendo que a obesidade NÃO era uma doença, e estes indivíduos escolheram sanduíches menos calóricos.

Agora vou dizer em que grupo estou. Em nenhum dos dois. Pelo menos não exatamente. Vou tentar explicar melhor.

Não sou particularmente a favor de nomear a obesidade como doença. Não porque eu ache que com isso as pessoas ficarão mais lenientes com sua alimentação, ou seja, ficarão mais “acomodadas”. Mas também não acho que chamar o obeso de “doente” reduz o estigma que ele tem na sociedade. Pelo contrário, minha opinião pessoal é de que isso só piora, já que você cria um estereótipo.

Além disso, me incomoda categorizar todo obeso como “doente”, pois dessa forma estaria fazendo uma generalização absurda. Afinal, existem obesos que comem bem, fazem exercício, adotam um bom estilo de vida, e portanto apresentam exames clínicos adequados (veja mais sobre obesos metabolicamente saudáveis aqui e aqui); sabe-se também que a obesidade pode diminuir o risco de mortalidade em algumas condições clínicas (veja aqui, aqui e aqui); o efeito que a obesidade tem na saúde também depende de onde a gordura está depositada no corpo, já que alguns depósitos de gordura são inclusive protetores à saúde (veja aqui e aqui); e, finalmente, devemos lembrar que as doenças que muitas vezes são associadas à obesidade – resistência à insulina, diabetes, câncer, hipertensão – nem sempre são causadas por ela, mas sim pelos mesmos fatores que contribuíram com a instalação da própria obesidade, isto é, um estilo de vida inadequado. Entenda-se: não é porque existe associação que existe correlação causal!

Mas mais importante do que categorizar ou não a obesidade como doença é a solução que estamos propondo para o “problema”: as dietas. Já escrevi alguns posts sobre isso (basta digitar a palavra “dieta” no buscador do lado direito do blog!) e tenho plena certeza de que elas só contribuem para que as pessoas engordem mais e mais. Chamar ou não a obesidade de doença é só a cereja do bolo de uma questão muito complexa que envolve toda a sociedade, e não só aqueles com peso a mais.




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